Na última segunda-feira (14) foi realizada uma audiência pública para discutir a situação das comunidades quilombolas e dos povos tradicionais. O momento foi fruto do requerimento 52/17, de autoria dos vereadores Luciano Sérgio e Francisco Thor de Ninha e teve como principal objetivo tratar do encontro de resistência pela retirada dos direitos quilombolas. No plenário, marcaram presença as comunidades do Cangula, Buri, Oiteiro, Catuzinho, Rio Seco e a diretoria regional do MST, entre outras representações.
O vereador José Cleto, presidente em exercício (Vice-Presidente da Câmara) abriu os trabalhos passando a palavra para o vereador Luciano Sérgio que falou da satisfação e alegria de desenvolver em parceria com o mandato do vereador Thor de Ninha e do Deputado Estadual Joseildo Ramos, a referida audiência.
No início da sua fala, o vereador Luciano Sérgio justificou: “Todos sabem que a razão da audiência é para que a gente possa de fato demonstrar a nossa insatisfação com a ação de nº 3.239 que foi entregue no Supremo Tribunal no dia 26 de junho de 2004 pelo antigo PFL, atual DEM, questionando o decreto que deu a titularidade a uma centena de comunidades quilombolas nesse país. No dia 16 de agosto teremos a votação desse mérito e a gente não pode em ações como essas deixar passar ao largo, não interferir, não debater, não discutir…Saíremos daqui com ações concretas a fim de, se não interferir na mudança do status quo dessa realidade mas que a gente demonstre a nossa insatisfação, a nossa reação…”.
O vereador passou a palavra para Thor de Ninha que discorreu sobre a importância do tema: “…Querem que nós não tenhamos direito aquilo que é nosso…a gente sabe que a luta é árdua, é dura mas vamos precisar empunhar mais uma vez a nossa bandeira, estarmos unidos e não permitir que direitos que estão sendo retirados não tenham resistência. Os nossos ancestrais nos ensinaram a resistir, assim que nós aprendemos e é dessa forma que nós vamos lutar…Estou muito feliz por este plenário estar cheio com aqueles que tem o sangue no olho e a vontade de lutar por aquilo que é nosso”
Logo após, foi exibido um vídeo com a fala do Deputado Estadual Joseildo Ramos que não pode comparecer à audiência em função de um compromisso com o governador Rui Costa. No vídeo, Joseildo declarou apoio à causa e falou da importância da luta na afirmação do direito das populações, principalmente daquelas que foram arrancadas da sua nação para cumprirem o papel de escravas no nosso país: “Nós estamos frente a frente com a possibilidade de atrasar conquistas que foram colocadas pelo governo Lula e Dilma…Nós não permitiremos nenhuma retirada de direitos!”, falando também da necessidade de mobilização. Foi exibido também um vídeo que faz parte da campanha “O Brasil é quilombola. Nenhum Quilombo a menos”.
A mesa foi composta, além dos vereadores autores por: Fábio Santana, assessor técnico da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (SEPROMI), Alfredo Ferreira, representando o deputado estadual Joseildo Ramos, Marli Monteiro, diretora do NTE – 18, Dr. Moacir Lira, representante do Núcleo Regional de Saúde, NRS Nordeste, Dr. Paulo Pinto, presidente da subseção OAB/Alagoinhas, Dona Lurdes, moradora da comunidade do Oiteiro e representante das comunidades quilombolas de Alagoinhas e Marizélia dos Santos, diretora de reparação racial.
Dr Moacir Lira falou dos enfrentamentos ao longo da história do povo negro no país, dos avanços que ainda precisam acontecer, e prestou esclarecimentos acerca das Redes de Atenção à Saúde, avanços e necessidades na área. “Nós estamos com o programa de saúde mental no Núcleo Regional de Saúde. Eu já falei com Rogério Ramos e, por afinidade, por desejo e por querer contribuir também na frente de trabalho em relação à população quilombola, me coloquei à disposição…Assumo aqui uma responsabilidade pública de estar a frente desse trabalho pelo NRS porque: sou negro, acredito no processo de transformação pela luta e afetivamente precisamos incluir aqueles que sempre foram marginalizados na história.”
Logo após, foi passada a palavra para Dona Lurdes, representante das comunidades remanescentes de quilombolas: “A nossa luta é grande, mas nós vamos vencer né? Eu espero que possamos alcançar alguma coisa dos direitos que dizem que os quilombolas têm, porque lá no Oiteiro não é diferente, todo mundo luta junto.” “Estamos correndo atrás do nosso direito…A comunidade do Oiteiro é uma comunidade carente e precisa de atenção…Precisamos nos dar as mãos e lutar todos juntos.”
O Sr. Paulo Pinto saudou a mesa e todos os presentes e na sequência ressaltou: “Nós estamos incorporados na luta! A instituição que eu represento que é uma instituição que defende a democracia, defende o estado democrático de direito e defende a população, precisa estar ao lado do povo e como ela sempre esteve nós permanecemos nessa luta e a disposição para contribuir”.
A Sra. Marli Monteiro destacou na sua fala: “A Bahia é o estado do país com o maior número de comunidades quilombolas e estão certificadas, reconhecidas, e essa certificação, quando uma comunidade quilombola se auto declara e pede ao estado brasileiro uma certificação, está pedindo nesse sentido reparação por anos e anos de exclusão, de invisibilidade como comunidade tradicional…quando uma comunidade briga por isso, é importante que nada seja perdido.”
Alfredo Ferreira apresentou, através de slides, o conceito de comunidade quilombola, e fez um resgate histórico e político, abordando as conquistas e possibilidades de retrocesso dos direitos conquistados. Trouxe também exemplos de organizações que defendem os direitos das comunidades quilombolas como o Instituto Pro Bono, o Conectas Direitos Humanos e a Sociedade Brasileira de Direito Público.
Fábio, assessor técnico da SEPROMI ressaltou: “O que está em risco nesse momento temeroso em que estamos vivendo não é apenas anulação do decreto 4887, porque se esse decreto for anulado põem em risco todas as políticas públicas iniciadas no Brasil a partir de 2003 com a chegada do nosso presidente Lula…Não é somente o decreto que vai cair, mas uma série de políticas públicas construídas pautadas sim nos movimentos sociais em destaque o movimento negro…”
A Sr. Ilza, presente na plateia, pediu autorização para cantar o hino da África, “Eu não posso participar de um encontro, de um debate que fale da minha história, de cultura negra sem lembrar o hino da África.”, cantando e emocionando todos os presentes.
O vereador José Cleto, entre outras considerações, solicitou: “Eu quero sugerir que possa ser colocado no relatório desta audiência pública como sugestão em que possivelmente/posteriormente possa haver uma unidade de saúde para atender essas comunidades quilombolas ali do distrito de Boa União”.
O vereador Pastor Lins parabenizou os vereadores Luciano Sérgio e Thor de Ninha por trazerem temas relevantes para serem discutidos na Casa Legislativa. “Sempre estive engajado nas lutas no sentido de defender aquilo que é interesse da população, da comunidade.”, colocando o seu mandato à disposição dos colegas.
Como resultado do encontro, alguns encaminhamentos foram realizados, a seguir: confecção de uma Carta Aberta a ser divulgada na Assembleia Legislativa da Bahia e na Câmara Federal, formação de uma comissão territorial, e ampliação na divulgação da petição pública que coleta assinaturas para a manutenção do decreto 4887/03 que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação de terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos.
O vereador Thor de Ninha informou ao colega Luciano Sérgio e aos presentes que lançará na Câmara uma moção de repúdio à ação do Partido Democratas (DEM). Na sequência, finalizou o encontro agradecendo a presença e deixando a seguinte mensagem: “Guerreiros e guerreiras, à luta porque a vitória é nossa!”. E ainda, proferindo a frase: “Fora Temer, Fora Temer, Volta Lula, Volta Lula!”.
Ascom – Câmara Municipal de Alagoinhas
Foto – Kekeu Barreto